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Contagem Regressiva

Atualizado: 24 de ago. de 2021


Voando entre duas camadas de nuvens

Hamburg, 06/06/2018 quarta-feira


A semana que antecedeu o embarque foi punk! As pessoas piraram com a greve dos caminhoneiros e passaram a se comportar de forma individualista, garantindo para si qualquer alimento e combustível que encontrassem. Foi meio assustador... Tentamos nos adaptar evitando deslocamentos desnecessários e usando mais a moto e menos o carro, e fazendo refeições adaptadas e mais simples. Assim pudemos continuar nossa rotina de trabalho sem maiores problemas.


Os preparativos da viagem ficaram parados desde a compra da moto, estávamos concentrados em finalizar os projetos em andamento antes de embarcar. Nessa maratona de trabalho intensivo recebi uma notícia preocupante: minha mãe torceu o pé 10 dias antes do embarque. A recomendação médica era usar cadeira de rodas e não deixá-la se apoiar sobre o pé magoado durante três semanas... Os dias seguintes foram tensos, porque estávamos considerando o adiamento da viagem, dependendo da evolução da lesão. O repouso e anti-inflamatórios ajudaram, o pé melhorou e, considerando que ela ficaria hospedada na casa da irmã que é enfermeira, decidimos manter os planos, pois estaria melhor cuidada lá que em sua própria casa. Mas os problemas não pararam por aí. Quatro dias antes do voo Gilson viu a dificuldade de urinar, que vinha sentindo a alguns dias, evoluir para micção com sangramento. Ele ficou emocionalmente muito abalado. No atendimento de emergência medicaram-no para controlar a pressão arterial que estava muito alta e solicitaram vários exames. Sem saber o que estava por vir, e preocupado que pudesse ser o pior, ele fez todos os exames nos dois dias seguintes, que constataram uma prostatite severa. O médico liberou a viagem, dizendo que não havia nada que pudesse ser feito nas próximas duas semanas além de tomar a medicação. Portanto, era melhor ir e aproveitar que ficar em casa com pensamentos sombrios.


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Embarcamos em Florianópolis com destino a Hamburg num voo com escalas de 9 horas no Rio de Janeiro e 3 em Frankfurt. Solicitamos atendimento prioritário para minha mãe, um direito para todas as pessoas a partir dos 60 anos de idade, que lhe assegura ser a primeira a embarcar e a última a sair em todos os voos, sendo conduzida com cadeira de rodas por um funcionário da companhia. Nossos bilhetes emitidos em conjunto asseguravam a mim e Gilson o direito de acompanhá-la furando a fila, e assim chegarmos aos locais com agilidade sem precisar procurar por eles. No Rio, o funcionário que nos guiou explicou como trocar a cadeira da empresa por uma da Cruz Vermelha e não ficarmos sem essa facilidade durante a longa espera entre os voos. Eu estava preocupada que espera de 9 horas pudesse ser muito difícil para minha mãe, mas a ala dos portões de embarque internacional é bem confortável com as espreguiçadeiras com vista sobre o aeroporto e a baia, música ambiente tocando bossa nova.


O voo internacional foi uma provação. Fui a infeliz passageira a ocupar a única poltrona com defeito do voo lotado, ela não reclinava. A classe turística é cruel, não se consegue levantar sem perturbar quem está ao lado e, se a poltrona da frente estiver reclinada, chegar ao corredor beira um atentado à dignidade humana! Em Frankfurt nos esperava um funcionário que parecia um executivo, ele conduziu a cadeira da minha mãe com uma seriedade e eficiência admiráveis. Aliás, tudo naquele aeroporto refletia essa imagem. Gilson teve vários momentos de "7 a 1 pros alemães", como quando foi ao banheiro e viu os mictórios que convidam a acertar o alvo ou fazer gol com o jato enquanto se esvazia a bexiga. Gilson completou seus 59 anos em trânsito, comemoramos com coca-cola e água mineral alemãs acompanhadas de sanduíches que compramos dentro do terminal de voos domésticos. O voo de conexão a Hamburg foi curto. Durante o procedimento de aproximação pudemos ver de cima a bela região de terras baixas onde Hamburg está situada, conhecida por Altes Land (Terras Antigas). Na paisagem de contornos orgânicos entranhada de vários de cursos d'água que vão dar no Mar do Norte, o verde predomina. Hamburg é o segundo maior porto da Europa e está situada a 100 km da costa, onde o rio Elbe encontra os rios Alster e Bille.


"Die Engeln fliegen in Kreisen... Wir sind die Engeln!" (Os anjos voam em círculos... Nós somos os anjos!). - disse minha mãe enquanto observava a paisagem durante os procedimentos de aproximação da nave.

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Ao desembarcar em Hamburg não havia cadeira de rodas nos esperando porque partimos com atraso, então a funcionária da companhia acionou a Cruz Vermelha. Quem chegou foi um colaborador grandão uniformizado que falava com um sotaque puxado e caminhava num molejo confortável. Ele conduziu minha mãe a passos largos, largos demais para eu pudesse acompanhá-lo, a ponto de perdê-lo de vista enquanto cumprimentava meu tio Gerhard que nos esperava, e só o avistei novamente quando já estava prestes a atravessar a porta para o exterior.


Gerhard e Samuel não poderiam ser mais diferentes. Samuel, filho da minha prima, nunca tinha me visto até então e me abraçou como se fôssemos velhos conhecidos. É espontâneo, intenso e multitarefa, e dessa forma conduziu o carro do aeroporto até o centro da cidade. Tive que conter o riso, estava me sentindo em casa. Samuel perdeu a saída correta e improvisou outro caminho até a casa onde minha mãe ficaria, mas não havia estacionamento, então ele parou sobre a ciclofaixa para desembarcamos. Foi quando ouvi uma reclamação intensa de um ciclista que parou para fotografar os três carros parados ali junto com o nosso. Meu tio Gerhard, com toda serenidade e clareza próprias do gentleman que ele é, explicou que se tratava do desembarque de um portador de necessidades especiais, e pediu que houvesse compreensão e respeito com aquela senhora que vinha de longe. Que aquele era o caminho mais curto até a porta prédio onde ela ficaria e assim a pouparíamos de caminhar mais que sua condição física permitia. Surpreendentemente, o ciclista aceitou o argumento e explicou que constantemente era impedido por motoristas sem escrúpulos de exercer seu direito.


Gilson ainda estava maravilhado com todas essas impressões e gostou de conhecer a casa de Gerhard, que pensou em mim ao preparar o jantar vegetariano. Conversamos até tarde e não conseguirmos mais parar de bocejar. Reservaram para nós lindo anexo independente nos fundos da casa de Brigitte, a vizinha. Estamos cansados, mas muito bem. Dormir às 22h com dia claro é estranho, Gilson não cansa de repetir.

 

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